Eleições

Disputa acirrada na Bahia pode terminar no primeiro turno... ou não

ACM Neto lidera, mas Jerônimo Rodrigues (PT) é herdeiro de corrente famosa por viradas espetaculares

A disputa pelo governo da Bahia nesta eleição coloca frente a frente mais do que candidatos: correntes de pensamento e legados de grandes personagens da vida política local -- com relevância para serem notados nacionalmente. 

Concorrem ao posto máximo no Palácio de Ondina ACM Neto (União Brasil); Jerônimo Rodrigues (PT); João Roma (PL); Kleber Rosa (PSol); Marcelo Millet (PCO) e Giovani Damico (PCB) (veja biografias no fim da reportagem). O eleitorado no estado passa de 11 milhões. Só na capital, Salvador, são 2 milhões. 

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A julgar pelo Datafolha mais recente (1º.out), ACM Neto está em franca vantagem, com 51% dos votos válidos na preferência dos eleitores. A margem de erro é de dois pontos percentuais, o que confere ao candidato do União Brasil chances de vencer a eleição já em primeiro turno. Jerônimo Rodrigues aparece em segundo, com 38%. João Roma tem 8%, Marcelo Millet, Giovani Damico e Kleber Rosa têm todos 1%. 

Fotografia e filme

Os números da ciência das pesquisas sugerem até a possibilidade de um desfecho para a disputa na votação já no primeiro turno. Mas levando em conta a história de outras eleições no estado e de seus personagens, pode ser apenas um ponto de partida --- ou a hora e o local para uma eventual virada que, se ocorrer, uma vez mais será espetacular.

Ao longo dos últimos anos, a Bahia assistiu ao processo eleitoral impor surpresas nada agradáveis ao que ficou conhecido no estado como carlismo: a sucessão de vitórias político-eleitorais conquistadas por Antonio Carlos Magalhães e seus aliados. Este ACM vem a ser avô, portanto, do candidato que hoje lidera a pesquisa mencionada acima. Foi nomeado governador em 1971. E a partir de então, deu início ao mais sólido processo de domínio da política baiana de que se tem notícia. Desde sua primeira eleição ao governo, em 1990, o pai do carlismo consolidava, então no Executivo, uma influência política que tem seus efeitos e alcances mais do que lembrados: estão em plena atividade até hoje. E com a marca da família impressa indelevelmente, inclusive, no cenário nacional. 

Vira vira

Na segunda posição nas pesquisas, Jerônimo Rodrigues é herdeiro e ativista de um meio político que iniciou seu fluxo vitorioso junto ao eleitorado a partir de 2006, quando da primeira eleição de Jaques Wagner pelo PT. De lá pra cá, foram dois governos de Wagner, dois governos de Rui Costa e mais: a boa avaliação que a atuação deste último na administração do estado faz constar da lembrança e do presente cotidiano da população baiana. O mesmo Datafolha atesta a realidade: Costa levou 49% de ótimo e bom na avaliação de seu governo. 

Esta herança do bom momento vivido pelo Partido dos Trabalhadores e seus coligados leva ao otimismo mais do que intuitivo, já aferido em eleições recentes, que faz pensar na chance de uma virada na régua das pesquisas -- e no momento decisivo. Em 2006, Jaques Wagner saiu de 31% na última semana de eleição para 52,89% na abertura das urnas. E assim bateu Paulo Souto, representante do grupo de ACM, que partiu de 48% antes da votação e fechou o turno com 43,03%. Vitória de Wagner em primeiro turno. 

2014 e contando

A sucessão de Jaques Wagner foi semelhante. Rui Costa saiu atrás, Paulo Souto em confortável dianteira e... vitória de Costa em primeiro turno: 54,53% para o petista, contra 37,39% de Souto, que competiu pelo Democratas. Para 2022, o nome do Partido dos Trabalhadores é Jerônimo Rodrigues, ex-secretário de Educação de Rui Costa. E que parece confirmar o DNA das participações de seu partido nas corridas recentes ao governo da Bahia: partiu de 33% das intenções de voto (14.jul) contra 40% de ACM Neto. Os números são da pesquisa selo Atlas Intel. Já na sondagem mais recente do mesmo instituto, sinais de uma "virada", que começava a se apresentar em meados de setembro: ACM Neto 40% e Jerônimo 47%, com chances matemáticas de vitória petista no primeiro turno. 

João Roma aparece com 10%. Os demais candidatos pontuam entre 0 e 2%. 

Pesquisa AtlasIntel para o governo da Bahia (26.set) | Reprodução/SBT

Equilíbrio distante

Por mais que os especialistas no assunto garantam que não se deva, em qualquer hipótese, comparar pesquisas diferentes -- já que há particularidades de método de aferição e afins --, a larga diferença de resultados entre os dois levantamentos mencionados sugere, ao menos, que o leque de possibilidades para o desfecho da eleição está totalmente aberto. Nessa linha de consideração, ainda que por pequena margem, existe a possibilidade de os prognósticos se encontrarem, se aproximarem muito ao menos. Quer dizer: em alguma medida, sob algum recorte, os desempenhos dos candidatos podem estar muito mais próximos, iguais... ou até apontando reviravoltas. Até estas, como vimos, não deixam de ser bastante aceitáveis no ar que se respira na Bahia.

A frieza dos números não traduz, por exemplo, como eleitores naturalmente bolsonaristas possam estar divididos entre o apoio a ACM Neto e ao "candidato próprio" João Roma (PL). Assim como Jerônimo, sob o signo de Lula favorito nas pesquisas à Presidência, precisa convergir a influência do ex-presidente para votos em sua candidatura. Não à toa, acompanhou Lula em uma caminhada muito concorrida pelas ruas de Salvador nesta 6ª feira (30.set). Pra onde vão se dirigir votos no aqui e agora do primeiro turno, como se vê, é uma questão em aberto. Dentro do leque de alternativas.

Muito competitiva

De toda forma, os analistas acham que não tem escapatória. A eleição ao governo baiano vai ser apertada e, sem exagero, decidida no voto a voto. Fatores puxam o braseiro a favor de um e de outro candidato alternadamente. ACM Neto vem da linhagem do carlismo, é ex-prefeito bem avaliado de Salvador. Começou a campanha lá atrás e inegavelmente anda perdendo votos. Jerônimo é a cara nova, jamais foi candidato antes e praticamente iniciou de súbito a campanha -- só que agora experimenta corrente ascendente.

O apoio das prefeituras é também relevante. Levantamento do Cientista Social Cláudio André de Souza fala em 260 prefeituras pró-Jerônimo, de um total de 412 no estado. Mas ACM Neto ganha nos municípios maiores.  

Campeonato empatado

As coisas na Bahia obedecem a razões que a própria razão desconhece. A religiosidade, a mística do viver baiano não pode ser desprezada, é quase "física" numa realidade que reúne crenças, comportamentos, preferências... que definem posições, decidem jogo. Tanto que foi tornada célebre a frase do jornalista e comentarista de futebol João Saldanha, segundo a qual...

"Se macumba ganhasse jogo, o campeonato baiano acabava empatado todo ano"

A rivalidade por aquelas paragens vai realmente ao infinito e além. Bahia x Vitória, no futebol. Ilhéus e Itabuna -- a segunda se emancipou no início do século passado, virou município, perdeu a praia... mas cresceu muito mais que a irmã mais velha --, e por aí vai. Baiano convive com as disputas, assim, desde sempre. Claro que a política acaba por se ver imersa neste caldo sócio-cultural. O campeonato mais recentemente inaugurado parece ser mesmo o que opõe o carlismo ao petismo. Com boas chances de uma goleada de um lado, de outro --- ou até um empate "técnico", na hora da decisão.

Folk-lore

A sabedoria popular (folclore) tem na Bahia um de seus endereços mais consolidados. E não é de agora. Consequência igualmente arraigada é a expressão de seus artistas, criadores... e políticos. Na reta de chegada da eleição -- ao menos em primeiro turno --, pipocaram aqui e ali ataques dos candidatos que, no mínimo, provocam eleitores de todos os matizes a admitir que sim: humor é fundamental. 

O candidato ACM Neto, por exemplo, buscou atingir uma fatia importante da população tentando se aproximar "genéticamente". Numa população com cerca de 80% de pardos e negros, impossível desprezar o que exprimem a cada passo de sua vida diária nos estilos, nas opções, nas suas necessidades e carências. De olho nisso, o neto de Antonio Carlos autodeclarou-se pardo. Não sem antes se expor a generosos feixes solares e atualizar o "bronze". Os adversários não perdoaram. Desde chamá-lo de "afroconveniente" -- por visar o resultado eleitoral --, até manifestações algo mais divertidas nas redes sociais. 

Claro que é o tipo da coisa que cai no gosto popular. Se rende votos, impossível prever. Mas o baiano dá mostras de que perde até eleição, mas não perde a graça. "É só um jeito de corpo", diria Caetano Veloso, não por acaso dos baianos mais célebres. Como fica a coisa, só no domingo pra se saber. Pode dar ACM Neto, pode dar Jerônimo... pode dar Roma? Tudo pode. "Ou não", como diria o poeta.  

Quem é quem

ACM Neto (União Brasil) é neto de Antonio Carlos Magalhães e herdeiro do carlismo. Advogado, foi prefeito de Salvador e deputado federal por três mandatos. 

Jerônimo Rodrigues (PT) é engenheiro agrônomo e ex-secretário de Educação do estado. É a primeira vez que disputa uma eleição.

Giovani Damico (PCB) é professor de geografia da rede estadual baiana. É o secretário político do PCB no estado. 

João Roma (PL) é ex-ministro da Cidadania do governo Bolsonaro. É advogado e ex-deputado federal pela Bahia e foi chefe de gabinete de ACM Neto.

Kleber Rosa (PSOL) é professor, cientist social e investigador da Polícia Civil. É sua primeira disputa eleitoral. 

Marcelo Millet (PCO) é motorista particular.  Foi candidato a vice-prefeito da capital em 2020, também pelo PCO e não se elegeu.

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