Congresso

No Congresso, 29 projetos já tentaram reduzir jornada de trabalho do brasileiro

Atualmente, há quatro proposições legislativas sobre o tema tramitando; todas as demais foram arquivadas

Medida cujo debate o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, defendeu neste mês, a redução da duração normal da jornada de trabalho, atualmente em oito horas por dia e 44 por semana, está entre os objetivos de ao menos 29 projetos de lei e Propostas de Emenda à Constituição (PECs) protocolados no Congresso Nacional no período pós-aprovação da Constituição Federal de 1988. Somente no século XXI, a média é de quase um texto apresentado por ano. São 20 no total.

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Quase todos dos 29, porém, foram arquivados. Apenas quatro ainda estão tramitando, sendo o Projeto de Lei (PL) 7663/2006, do deputado federal Daniel Almeida (PCdoB-BA), que reduz para 40 horas a jornada semanal de trabalho; a PEC 148/2015, do senador Paulo Paim (PT-RS), que altera o inciso XIII do art. 7º da Constituição, para reduzir a jornada de trabalho semanal a 36 horas; o PL 10571/2018 do deputado Patrus Ananias (PT-MG), que altera a redação dos art. 58 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para fixar duração normal da jornada semanal em 40 horas; e a PEC 221/2019, do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), que altera o Art. 7º inciso XIII da Carta Magna, reduzindo a jornada de trabalho a 36 horas semanais em dez anos.

O levantamento foi feito pelo SBT News por meio das ferramentas de pesquisas de projetos e matérias presentes nos portais da Câmara e do Senado. Não foram consideradas as proposições legislativas que promoviam a redução para públicos específicos -- como deficientes e categorias profissionais --, para período específico e/ou com redução de salário proporcional.

Petistas são os que mais aparecem como autores: 12 das 29 foram protocoladas por integrante do Partido dos Trabalhadores. Paulo Paim é o nome que mais apresentou propostas, com sete. Confira:

A Constituição estabelece que a duração do trabalho normal não será "superior a oito horas diárias e 44 semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho". Já o artigo 58 da CLT diz que "a duração normal do trabalho, para os empregados em qualquer atividade privada, não excederá de oito horas diárias, desde que não seja fixado expressamente outro limite".

Em 9 de outubro, participando de audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, do Senado, Luiz Marinho disse acreditar que a economia brasileira "suportaria" uma redução da jornada de trabalho sem diminuir o salário dos empregados. A declaração veio após o presidente da comissão, Paulo Paim, relembrar na audiência que, com a promulgação da Constituição de 1988, a jornada passou de 48 horas para 44 horas semanais e, desde então, não houve mais "evolução".

"Agora o mundo está debatendo a possibilidade até de quatro dias, com experiências... se você puder falar um pouco sobre o tema, eu sei que você é um estudioso da matéria. No sentido de mostrar que é um debate que vai estar sempre vivo", complementou o senador.

O ministro, comentando, pontuou também: "Esse debate da jornada é importantíssimo, e eu até brincava com as centrais [sindicais] esses dias se eles não iriam pautar esse debate. Porque não é um debate meramente de governo, é um debate para a sociedade, e quem é a autoridade para dar a palavra final é o Congresso Nacional, o Parlamento. Portanto, é preciso se movimentar em relação a isso para que o Congresso possa refletir, avaliar e tomar a decisão se é hora, se é momento de fazer uma nova regulagem de jornada".

O SBT News pediu um posicionamento sobre o tema às principais centrais sindicais. Todas disseram ser favoráveis à redução. A Central Única dos Trabalhadores (CUT) disse que sempre a defendeu "quando ela é uma questão congressual, mas a CUT tem sindicatos fortes que conseguem fazer negociação e acordos coletivos que estabelecem essas jornadas inclusive abaixo do que tem hoje dentro da legislação".

CTB fazendo manifestação (CTB)

A Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) afirmou que a redução de jornada de trabalho é uma "bandeira histórica" da entidade e da classe trabalhadora, "uma luta secular que orientou a criação do 1º de Maio e que agora retorna com força à ordem do dia". "Está na hora de realizar uma campanha nacional por uma jornada menor".

Para a CTB ainda, "experiência exitosa de implantação da semana de quatro dias em vários países do globo mostra que ao propiciar bem-estar para quem trabalha, sendo um remédio contra o stress e as doenças ocupacionais, a redução da jornada eleva a intensidade e a produtividade do trabalho, trazendo ganhos para a empresa, razão pela qual muitos empresários têm aderido à proposta".

O presidente da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB), Antonio Neto, ressaltou já serem "35 anos sem redução de jornada apesar das novas tecnologias, automação, inteligência artificial, entre outras novidades que aumentaram exponencialmente a produtividade". "Passou da hora dos avanços tecnológicos se traduzirem em ganhos aos trabalhadores".

Ele prosseguiu: "Em SP, os profissionais em TI já conseguiram a jornada de 40 horas na Convenção Coletiva e começam a discutir uma nova redução, seja para 36 horas ou para novos modelos de jornada, como a jornada de quatro dias". "A CSB é favorável à medida como uma ação efetiva para gerar empregos e garantir uma melhora da qualidade de vida dos trabalhadores brasileiros".

A Ordem dos Trabalhadores do Brasil (OTB) disse ter "posição favorável à redução, porém amplo debate em relação ao tema é necessário, com participação dos trabalhadores, empresários e do Congresso". "Embora compartilhemos da crença que a economia brasileira comporta uma semana com quatro dias de trabalho - sem redução de salários - não acreditamos que todos os seguimentos econômicos comportariam a mudança, no momento".

Ainda de acordo com a OTB, "o debate é preciso, em especial quando se inclui, além do tempo trabalhado formal, aquele registrado em carteira, o trabalho não formalizado, em especial os trabalhadores por aplicativos ou autônomos, que tem todo tipo de jornada, normalmente extensa". A entidade diz compartilhar também "o posicionamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tem por convenção a jornada de 40 horas desde 1935, e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que igualmente regulamenta jornadas de 40 horas semanais".

O presidente da Nova Central Sindical de Trabalhadores, Moacyr Roberto Auersvald, pontuou que há muitos anos a entidade e as outras centrais existentes no país vem trabalhando para a redução da jornada de 44 horas semanais. "Sempre foi pauta de todas as centrais essa redução das 44 para as 40 horas. E a gente tem que entender o seguinte: a maioria das indústria e uma boa parte de prestação de serviço hoje já pratica as quarenta horas. Quem não pratica normalmente é o comércio", complementou.

Segundo Moacyr, a média internacional de horas de trabalho é de 36,8, e a do Brasil fica em 39,5. Dessa forma, diz, já existe uma jornada menor na prática, mas "precisava ter uma confirmação para o restante do mercado que não contribui com essa redução de jornada, para que retornasse às 40 horas". De acordo com ele, a medida geraria mais empregos, e onde foi estipulado tempo de trabalho de quatro dias por semana, no mundo, houve uma diminuição significativa de ausência no emprego, a produtividade aumentou, e a rentabilidade cresceu de modo geral. 

Para a União Sindical dos Trabalhadores (UST), tanto o empregado como a empresa ganham com a redução da jornada das atuais 44 horas. "O trabalhador ganha porque vai ter um descanso maior. O mercado econômico ganha porque vai gerar mais emprego", fala o presidente da entidade, Carlos Borges. Com mais pessoas empregadas, ressalta, "vai girar um pouco mais da economia".

Outro lado

A reportagem pediu posicionamentos também para Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). "A redução da duração do trabalho normal para menos de 44 horas semanais, conforme previsto atualmente pela Constituição Federal, é tema a ser tratado por empresas e trabalhadores em processos de negociação coletiva", afirma a primeira.

Para a CNI, "uma eventual imposição por lei de limite inferior a 44 horas para o trabalho semanal não só enfraquece o processo de diálogo entre empregadores e empregados, como desconsidera as variadas realidades em que operam os setores da economia, os segmentos dentro da indústria, o tamanho das empresas e as disparidades regionais existentes no país".

Ainda conforme a confederação, "uma eventual redução obrigatória, estabelecida por lei, deve produzir efeitos negativos no mercado de trabalho e na capacidade das empresas de competir, sobretudo aquelas de micro e pequeno porte". Ela afirma que a justificativa de que uma redução da jornada estimularia a criação de novos empregos não se sustenta e é uma conta que não fecha.

A CNC, por sua vez, disse que não se manifestará sobre o tema, pois "a discussão ainda é muito incipiente e concentrada só em algumas falas do ministro do Trabalho".

Propostas em tramitação

A PEC de Reginaldo Lopes que está em tramitação encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara. No dia 9 deste mês, o relator, deputado Tarcísio Motta (Psol-RJ), apresentou seu parecer; ele defende a admissibilidade do texto. A reportagem perguntou ao autor da PEC se, em sua avaliação, existe a possibilidade de o tema da redução da jornada de trabalho ganhar força na atual legislatura e a proposta ir para votação no plenário.

"O Brasil está discutindo a nova reindustrialização. Você tem uma conjuntura que a nossa economia terá que ser muito mais dinâmica. Terá que ser uma economia com muito mais transição ecológica, ambiental, mais sustentável, e o Brasil também terá que ter maior eficiência produtiva. Então, num primeiro momento, nós estamos fazendo a reforma tributária, que eu acho fundamental", começou respondendo.

"A reforma tributária é a maior e melhore reforma estruturante na pós-redemocratização do país, porque ela dá eficiência, ela tira o imposto sobre imposto, ela cobra imposto só do valor adicionado e não no valor acumulado. Então ela faz o Brasil, no mundo aberto, voltar a ser competitivo, porque diminui a sua carga tributária, tem um modelo de padrão internacional".

Ele prosseguiu: "A segunda questão é que você vai ter uma economia que tem que ser muito mais dinâmica. Ou seja, a inovação tecnológica, a economia digital, a inteligênca artificial. E por isso eu acho que faz parte do aumento e da escala de produtividade uma carga de trabalho mais equilibrada. Porque esse mundo também, com certeza, ele acaba ocupando um pouco do espaço da atuação física do trabalhador, e ele precisa dedicar uma atuação de grande qualificação profissional, de um trabalho mais elaborado".

Para que o grau de produtividade do trabalhador brasileiro possa ir ao encontro desse novo mundo mundo, disse o deputado, "é importante essa redução da jornada de trabalho, que não tem sentido". De acordo com ele, há empresa no Brasil que pratica 30 horas de trabalho, sendo seis horas diárias e cinco dias na semana, e "tem resultado extraordinário". 

Palácio do Congresso Nacional (Agência Brasil)

Questionado sobre o que dificultou a tramitação da PEC até o momento e se há, no geral, uma falta de interesse dos deputados em discutir esse tema, ele pontuou: "Eu acho que o Parlamento e as legislações são fruto de um amadurecimento da sociedade. Primeiro ocorre na sociedade, depois ocorre no Parlamento, então é uma consequência. Então você aponta caminhos, aponta novas diretrizes, novos parâmetros, e a partir do teste mais empírico dessas teses, acaba virando uma legislação mais normativa".

Em suas palavras, "o Parlamento é a Casa da provocação". "Então cabe a minha atuação como parlamentar dar voz e vez a esse sentimento que cresce no inteiror da classe trabalhadora".

Para o senador Paulo Paim, autor da PEC 148/2015, o tema da redução da jornada de trabalho "está em destaque", pois a tendência mundial "é de adesão à redução da jornada". "Vários países já adotam o sistema de 40 horas semanais e outros já testam a semana de trabalho de quatro dias, ao invés de cinco. São importantes a mobilização social e a atuação dos diversos movimentos interessados no tema, para cobrar dos parlamentares o avanço da tramitação da PEC".

Ainda de acordo com ele, a redução da jornada para pelo menos 40 horas semanais está no eixo dos debates da Sugestão Legislativa 12/2018, chamada também de "Novo Estatuto do Trabalho", a qual Paim é relator na Comissão de Direitos Humanos.

A reportagem perguntou ao senador também sobre o que dificultou a tramitação da PEC 148/2015 e se falta interesse por parte dos senadores em discutir uma diminuição. "A tramitação das matérias no Congresso Nacional, em geral, depende de vários fatores, como: a vontade política, a mobilização social e o interesse dos parlamentares e do governo. Essa, em particular, depende da conjuntura favorável, que no momento converge. O movimento sindical é fundamental", respondeu o petista.

"No caso de uma Proposta de Emenda à Constituição, que normalmente envolve temas sensíveis, há a necessidade de um debate mais profundo com a sociedade. Por isso, não é possível responsabilizar apenas um dos atores envolvidos pelo tempo no trâmite da matéria. Como eu disse, a conjuntura econômica, social e política podem favorecer o avanço da matéria".

Além de ter apresentado as seis propostas que reduzem a jornada de trabalho, o senador protocolou, em 2005, dois Projetos de Lei do Senado (PLS) que criam o Pacto Empresarial para o Pleno Emprego (Pepe), com o objetivo de reduzir a jornada das atuais 44 horas semanais para 36 horas, sem redução de salários, em regime de seis horas por dia, ou do modo como for ajustado entre empregadores e empregados. A adesão das empresas ao Pepe seria voluntária. Ambos os textos foram arquivados.

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