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Brasil e Argentina contra a soberba europeia

Parte da mídia da Europa não consegue digerir o fato de que no sul da Ásia são os sul-americanos, e não os europeus, a principal inspiração

No hotel onde estamos hospedados, o carrinho da limpeza passa pelos corredores com uma bandeira da Argentina. Foi ideia de Sohan, 25 anos, funcionário da limpeza e um dos milhares de imigrantes de Bangladesh no Catar.

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Mais do que uma pequena provocação aos hóspedes brasileiros pra quem ele já abre um sorriso quando encontra, é um sentimento genuíno de admiração pela seleção argentina. Sohan não é exceção, mas um produto de sua própria cultura. Em Bangladesh, cresceu num ambiente onde ou você é Brasil ou Argentina.

Em uma corrida de Uber, o motorista Newton, também de Bangladesh, dirigia com uma camisa da Seleção. Ficou com a voz embargada ao descobrir que os passageiros que levava eram do Brasil. Passou boa parte da corrida mostrando os vídeos de seu país e tentando fazer chamadas de vídeo para os amigos que, como eles, são apaixonados pela seleção de um país tão distante e, ao mesmo tempo, tão próximo deles.

Bangladesh? Sim, meus caros. E ainda tem a região de Kerala, no sul da Índia, onde milhões também replicam a rivalidade sul-americana com camisas, bonecos gigantes de Neymar e Messi, muros e prédios pintados e bandeiras de dar inveja às maiores torcidas organizadas brasileiras.  

A paixão que vem da infância é obviamente reproduzida nas ruas do Catar, que tem centenas de milhares de imigrantes destes 2 países. Uma rápida pesquisa no Google e um papo com o sujeito que limpa o seu quarto, serve nos restaurantes ou dirige um Uber em Doha já dariam muitas pistas sobre esse fenômeno que o futebol construiu em 2 países com pouca tradição neste esporte.

Apesar das fartas evidências, alguns veículos e jornalistas europeus usaram fotos desses imigrantes no Catar pra sugerir que eles estavam sendo pagos pra "animar" a Copa. Em mensagem publicada em sua conta no Twitter, a emissora pública alemã "Deutsche Welle" perguntou:

"Torcedores reais ou atores pagos? Manifestações raras nas ruas de Doha são registradas antes do início da Copa do Catar".

O tablóide britânico The Sun foi ainda mais longe. Chamou torcedores como Sohan de "fãs de plástico" e diz que o "Catar está sendo acusado de pagar centenas de 'torcedores falsos' pra marchar em frente às câmeras na semana que antecede a Copa do Mundo".

O sujeito por trás do verbo acusar nunca é revelado. Está tão oculto quanto a verdade.  

Na saída do estádio Lusail, onde a Argentina tinha acabado de perder para a Arábia Saudita, o indiano George, vestido com a camisa 10 de Messi, nos aborda com um pedido:

"Avise lá que eu não fui pago pra estar aqui. Vim com o meu dinheiro".

Não era um recado pro Brasil. Era um desabafo pra mídia que duvidou do que ele sentia.  

Sohan, 25 anos, imigrante de Bangladesh | Sérgio Utsch/SBT News

A grande ironia dessa história é que os torcedores verdadeiramente pagos dessa Copa vem justamente de países como Alemahha, Inglaterra, Estados Unidos, Canadá e Austrália.

O Catar bancou as viagens e os custos de 1.600 pessoas, a grande maioria de países ricos, pra promover o Mundial em suas redes sociais, algo que seus imigrantes, a grande maioria de países pobres, fazem de graça.

As informações estampadas nas manchetes de alguns jornais e portais europeus não são apenas jornalismo de má qualidade. São um misto de ignorância e soberba. É um comportamento que diz muito mais sobre aqueles que apontam os dedos do que sobre o alvo de sua arrogância.

Juntas, as 2 maiores das Américas ganharam seus 7 títulos mundiais em cima de seleções europeias que, aliás, também tem a simpatia de muitos bengalis e indianos, ainda que a maior parte da torcida fique com Brasil e Argentina. É tão forte que a rivalidade inspira até comerciais na TV. 

Nas vitórias e derrotas das seleções de Brasil e Argentina, haverá uma explosão de alegria e de tristeza pra milhões no sul da Ásia, onde, por tantos anos, a Europa ditou as regras.

Acostumados à reverência do resto do mundo, alguns europeus sofrem do mal da empáfia, que causa uma cegueira tão grande e forte quanto os gritos que soam da Índia e de Bangladesh pelos grandes da América do Sul. Narcisos, acham feio e falso tudo o que não é espelho.

Torcedores indianos foram ao Catar assistir os jogos do Brasil na Copa | Sérgio Utsch/SBT News
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