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Macron e Le Pen disputam votos de uma França dividida

Cientista político Gaspard Estrada avalia possível resultado da eleição mais disputada dos últimos 20 anos

Marcado para acontecer em 24 de abril, o segundo turno das eleições presidenciais na França está indefinido e, pela primeira vez, um candidato da extrema-direita pode se eleger e governar o país que está no coração da Europa. Mais votados no primeiro turno, o atual presidente Emmanuel Macron (República em Marcha), e a nacionalista Marine Le Pen (Reagrupamento Nacional) disputam a preferência dos eleitores, que, segundo pesquisas, estão mais indecisos do que há cinco anos e, sobretudo, do que 20 anos atrás, quando houve a primeira eleição com extrema-direita no segundo turno.

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No último domingo (10.abr), Macron alcançou 27,8% dos votos, enquanto Le Pen recebeu 23,1%. O líder de extrema-esquerda Jean-Luc Melenchon foi o terceiro colocado, com cerca de 21%. Em 2017, o presidente francês venceu a nacionalista no pleito com ampla vantagem, mas o mesmo resultado está longe de ser garantido desta vez.

+ Macron e Le Pen vão disputar segundo turno na França

Em entrevista ao correspondente do SBT Sérgio Utsch, o mestre em ciência política pela Universidade Sciences Po de Paris Gaspard Estrada desenhou o atual cenário político na França e o possível resultado de 24 de abril. Para Estrada, o que deve decidir o pleito será a mobilização dos eleitores. "O que vai pesar vai ser a mobilização, a participação da sociedade primeiro no debate, e no dia 24 de abril, no dia da eleição, e quem vai se mobilizar e, nesse ponto de vista, o fato de 30% dos eleitores de Jean-Luc Mélenchon (França Insubmissa) falarem que podem votar na Marine Le Pen, pode levar ela a um patamar muito elevado. Agora, não sabemos até que ponto ela pode chegar." 

No cenário de segundo turno, as pesquisas de intenção de voto mostram uma paridade numérica entre os concorrentes: Macron com 51% e Le Pen com 49%. Para garantir a reeleição, Macron deve continuar com a campanha contra o extremismo. O fato de Le Pen já ter se posicionado abertamente contra a Otan e favor do "Frexit" -- a saída da França da União Europeia --, além de não esconder a admiração pelo presidente russo Vladimir Putin, serão amplamente usados nas próximas semanas. Todavia, disputando sua terceira campanha à Presidência, a candidata buscou uma nova imagem. Autointulada como a Dama do Estado, ela aliviou a retórica racista e xenofóbica que adotava em seus discursos. Agora, fala sobre o que preocupa a maioria dos franceses -- o aumento do custo de vida.

Do ponto de vista do especialista, isso faz com que ambos os candidatos tenham pontos favoráveis para garantir uma vitória.

"O Macron tem ao seu favor um balanço econômico positivo, onde você, por um lado, tem um crescimento econômico expressivo em 2021, 7% de crescimento, e sobretudo um desemprego em queda, 7,4% de desemprego, que é muito menos que 2017. Agora, ao seu desfavor, está essa imagem de distância, arrogância com relação aos franceses, e esta inflação que começou a aparecer no começo do ano após a guerra da Ucrânia. Por outro lado, ao que tem haver com a Marinne Le Pen, ela tem capitalizado a coerência do seu discurso e tem focado na economia, em vez de falar de temas mais polêmicos, como a imigração e a agenda da extrema-direita -- que continua no seu programa, mas não faz parte do coração central da sua comunicação -- e, finalmente, o fato de ter um candidato ainda mais à direita do que a própria extrema-direita,  Éric Zemmour (Reconquête), fez com que ela mecanicamente ficasse mais ao centro do debate público. No entanto, suas ideias continuam as mesmas", diz Estrada

Agendado para acontecer em 20 de abril, o debate entre Le Pen e Macron deve decidir o resultado das urnas, o que não é bom para a candidata do Reagrupamento Nacional, de acordo com o Estrada. Ao ser questionado se Le Pen nunca esteve tão próxima de ser eleita presidente da França, o acadêmico foi cauteloso. "Segundo as pesquisas, sim. Agora, temos que acompanhar como vai ser essa campanha de segundo turno. Em particular, o debate na TV no dia 20 de abril, um debate onde ela se deu mal há cinco anos, e, no meu ponto de vista, terá uma importância estratégica nessa eleição."

Apesar de acreditar na reeleição de Macron, Estrada analisa que a atual eleição colocou por terra muitos mitos sobre o pleito. Se em anos anteriores, a coalizão entre partidos de extrema-esquerda, esquerda e centro era suficiente para barrar a eleição de um líder da extrema-direita, em 2022 não mais. "Quando a Frente Nacional ou extrema-direita chegava ao segundo turno, criava-se uma espécie de cordão sanitário contra a extrema-direita. Nesta eleição, mais uma vez, a classe política fez essa escolha de modo marjoritário. No entanto, não é o que as pesquisas indicam, os eleitores franceses estão mais divididos do que cinco anos e sobretudo do que 20 anos atrás, quando houve essa primeira eleição com extrema direita no segundo turno. É por isso que hoje a eleição está muito mais disputada, será uma eleição acirrada e é por isso que precisamos estar muito atentos até o dia da eleição", aponta, e completa:

"Ninguém imaginaria que Jean-Luc Mélenchon chegaria a 22%, ninguém pensaria que o próprio Macron chegaria a 27%. Hoje, o mais provável, é que Emmanuel Macron seja reeleito presidente da França. No entanto, vai ser uma campanha acirrada. Desde o resultado eleitoral de domingo, foram publicadas três pesquisas de opinião, duas dão Macron como vencedor e uma dá empate técnico". 

Brasil

Uma possível mudança de poder pode resultar em uma melhoria na relação Brasil-França. Ainda que não seja simpática ao acordo Mercosul-União Europeia, ter uma líder de extrema-direita no França é positivo para o presidente Jair Bolsonaro (PL), avalia o professor. " O governo brasileiro está muito isolado no cenário internacional e ter uma liderança de extrema-direita no coração da Europa, que desarticularia a União Europeia, e portanto daria uma porta de saída à Rússia, eu acho que seria uma notícia muito positiva para Bolsonaro." Estrada acredita que Le Pen seria uma aliada do atual presidente do Brasil. 

" Hoje o Bolsonaro não tem nenhum aliado de peso no cenário internacional, é uma pessoa que hoje, inclusive, nunca falou por telefone com o presidente Biden, que está há mais de um ano no cargo, que tem uma dificuldade muito grande de dialogar com a Europa -- a última viagem dele ao continente foi um exemplo disso -- e portanto, ter uma pessoa com quem possa falar na França seria um diferencial."

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