Brasil

Representatividade feminina em conselhos profissionais avança lentamente

A partir de 2022, cinco das 27 seccionais da OAB serão presididas por mulheres

Marco histórico para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), as vitórias das chapas encabeçadas pelas advogadas Patricia Vanzolini, Cláudia da Silva Prudêncio, Marilena Indira Winter, Daniela Borges e Gisela Cardoso, nas eleições deste ano das seccionais da entidade, se inserem num contexto em que a sociedade brasileira -- majoritariamente feminina (52% da pessoas) -- traz uma preocupação crescente em aumentar a representatividade das mulheres e, ao mesmo tempo, ainda é composta por uma parcela que se opõe à presença delas em postos de liderança, atrasando, assim, o aprimoramento da democracia.

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A análise é da bacharel em ciências sociais, doutora em ciência política e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mayra Goulart. Segundo ela, diferentes grupos da sociedade brasileira desejam "aumentar a representatividade dos espaços de comando, dos espaços das elites de modo geral, ter elites política e social mais representativa do que é a base, e não uma que é constituída por corpos brancos, masculinos, corpos muito identificados num determinado segmento social de elite".

Por outro lado, acrescenta, representantes dessa hegemonia reagem "ao empoderamento de mulheres, de negros, de minorias". Para a professora, aumentos de representatividade como a das pessoas do sexo feminino são "ainda muito moleculares, muito lentos". "Então é como se a gente estivesse comemorando, mas ainda é muito pouco, ainda é tão pouco que a comemoração é meio que um lamento. Porque era para estar evoluindo de uma maneira mais rápida. É uma evolução cheia de sobressaltos e que causa reações desses segmentos conservadores muito duros", completou.

Pela primeira vez desde sua criação, em 1930, a Ordem dos Advogados do Brasil terá cinco mulheres presidindo seccionais. Patricia Vanzolini, Cláudia da Silva Prudêncio, Marilena Indira Winter e Daniela Borges serão as primeiras das seções de São Paulo, Santa Catarina, Paraná e Bahia, respectivamente. Gisela Cardoso, por sua vez, é a segunda da seção de Mato Grosso. As 22 seccionais restantes serão comandadas por homens, no triênio de 2022 a 2024.

Chapas eleitas OAB 2021 by Guilherme Delinardi Resck on Scribd

Segundo o quadro de advocacia da OAB, entre os profissionais regulares e recadastrados, há 623.702 mulheres e 615.752 homens. Porém, mesmo entre os cinco integrantes da diretoria do conselho federal da entidade, não há pessoa do sexo feminino. Já no escritório VBD Advogados, no Itaim Bibi, zona sul de São Paulo, apontado como o mais admirado na área de direito imobiliário pelo anuário Análise Advocacia 2021 e reconhecido como "excelente" em direito imobiliário e com "prática notável" como consultor tributário pela Leaders League, a paridade de gênero entre os sócios foi alcançada. São três homens e três mulheres.

Ainda de acordo com o sócio-fundador Olivar Vitale Junior, "o VBD tem em seu quadro de profissionais número considerável maior de mulheres em relação aos homens". Em sua visão, o aumento de representatividade delas na OAB e no Poder Judiciário "é fundamental à busca de Justiça em nosso país, vez que sem diversidade não há a tão almejada pluralidade de pensamentos, costumes e lideranças". A advogada Daniele Gazel, sócia executiva do escritório, afirma que, com a eleição das cinco mulheres presidentes de seccionais nas últimas eleições, se sentirá "mais representada na OAB". "Estou otimista que haverá uma revolução de paradigmas nesta nova gestão por nossas mulheres presidentes e que com o aumento da representatividade das mulheres o preconceito, que ainda existe, diminuirá", acrescentou.

Para Gazel, "infelizmente, mesmo nos dias atuais, em qualquer carreira a mulher tem que se provar muito mais do que o homem para mostrar sua competência. E na advocacia isso não é diferente". "Como advogada que atua em um ambiente de negócios de alta complexidade, em negociações duras e tensas, muitas vezes experimentei na pele o preconceito (velado, nas entrelinhas, nos comentários indiretos, o que é ainda pior), substancialmente de homens, mas não exclusivamente deles".

Outros conselhos profissionais

A desigualdade acentuada entres os números de mulheres e homens ocupando posições de liderança em conselho profissional não se restringe à OAB. Dentre os 27 Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), por exemplo, há seis mulheres presidentes, sendo que, no final de 2020, 46,6% da população de médicos era do sexo feminino. Na diretoria do Conselho Federal de Medicina (CFM), dos 11 integrantes, oito -- incluindo o presidente -- são homens.

Nos Conselhos Regionais de Administração (CRAs), há apenas três mulheres presidentes. Dos nove integrantes da diretoria do Conselho Federal (CFA), oito, entre os quais o presidente, são homens. Em 2019, as mulheres correspondiam a 34% dos profissionais da área. A atual gestão do CFA criou o Comitê ADM Mulher, com o objetivo de aumentar a participação feminina na entidade e nos CRAs. Além disso, pretende mudar o regimento das eleições, a partir das próximas, marcadas para 2022, para fazer crescer a quantidade de candidaturas de pessoas do sexo feminino.

Dentre os 27 Conselhos Regionais de Enfermagem (Corens), 11 presidentes são mulheres. Em três estados, segundo o Conselho Federal (Cofen), só há homens em postos de diretoria. Na diretoria do Cofen, há quatro homens e duas mulheres - incluindo a presidente. Entretanto, no início deste ano, 85% dos profissionais da área eram do sexo feminino.

Nos Conselhos Regionais de Economia (Corecons), por sua vez, há três mulheres presidentes. Em 2020, o Conselho Federal (Cofecon) criou a Comissão Mulher Economista, que, segundo a coordenadora, Mônica Beraldo -- que é conselheira federal do Cofecon também --, tem o objetivo de fazer com que "mulheres registradas no sistema sejam convidadas e conquistem os seus espaços nas plenárias dos conselhos regionais e do próprio Conselho Federal de Economia".

"Essa comissão está nesse processo de busca por maior representatividade, por meio da conscientização dos colegas que estão lá nos conselhos regionais. Fazendo debates nas universidades, promovendo campanhas da importância do curso de economia e da importância das mulheres economistas estarem envolvidas nesses cursos, de modo a se unir a tantos pensadores que pensam o desenvolvimento econômico, que pensam a questão da mulher", completou. Em 2018, mulheres correspondiam a 26,8% dos registros profissionais de economia.

Já em relação aos conselhos regionais de arquitetura e urbanismo, área na qual há 123.997 mulheres atuando e 69.446 homens, há seis mulheres presidentes. No conselho diretor da entidade nacional (CAU/BR), foi atingida paridade de gênero: três homens e três mulheres.

Importância de maior representatividade

Segundo a cientista política Mayra Goulart, aumento da representatividade das mulheres e de outras minorias é importante por dois motivos. O primeiro deles está relacionado com uma "questão de identidade desses grupos e de identidade em termos daquilo que eles podem se tornar". Isso significa, diz Mayra, que se não for possível ver mulheres ocupando "todas as funções do espectro social, as meninas, as jovens não vão se entender como possíveis ocupantes nesses espaços". O segundo motivo, diz a professora, diz respeito à representação de ideias, ou seja, a pluralidade de pensamentos ganha espaço.

Políticas afirmativas

A preocupação crescente na sociedade brasileira com o aumento da representatividade das minorias, afirma a professora, "se vale ao esforço, aos corpos, às vozes silenciadas e subalternizadas de todos aqueles que nos precederam e que mesmo à revelia de seus próprios tempos lutavam por uma sociedade diferente". "Quer dizer, que se agora essa semente está germinando é porque em momentos em que essa semente não germinava e, pelo contrário, era silenciada, havia gente que manifestava vozes descontentes e que conseguia romper essas bolhas".

Porém, de acordo com Mayra, programas de ação afirmativa "exercem um papel fulcral em estimular a representação desses grupos subalternizados". "Porque se a gente tem um histórico social e uma cultura patriarcal, racista, machista, a gente não pode esperar que espontaneamente isso vai mudar. A gente precisa de incentivos institucionais, que reforcem os estímulos dessas categorias para que elas alcancem locais, lugares de representação nessas elites. Elites políticas e sociais", pontuou.

No ano passado, o Conselho Federal da OAB determinou que a composição das chapas nas eleições da entidade considerasse paridade de gênero e cota racial de 30% a partir de 2021.

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